terça-feira, 23 de junho de 2009

Cronologia Abundante

Clara nasceu num casebre sem janelas na Rua dos Alfaiates Ingleses, nos anos 30.
Migrou a vida inteira em busca de, em busca de quê?
Até que encontrou companhia fraterna. Não teve filhos, mas tem netos.
Teve um ou três amantes suburbanos. Sempre quis ter uma vida boêmia, mas faltou-lhe coragem.
Faltava-lhe coragem para se expressar, para gritar, para correr.
Nunca estudou, porém olhava aqueles inúmeros garranchos alheios com fascinação. Nunca ousara ter grandes sonhos, exceto o de escrever o próprio nome, o de poder abrir aquelas páginas empoeiradas, trancafiar-se em sua latrina e decifrar as frases uma por uma.
Contudo, sempre deixou para depois. Num piscar de olhos, já integrava o clube das lobas que nunca caçaram.
E foi adiando, driblando, tentado esvair-se da velocidade de transição dos segundos e minutos e horas e dias e semanas e meses e anos.
Talvez faltou quem lhe desse um apoio constante, mas hoje suas tentativas de aprender o seu desejo são suprimidas. Pois, ela tentou, mas já é tarde, pois o seu inverno está no ponto mais alto e numa acentuadíssima artrose, Clara não consegue nem segurar um lápis.

4 comentários:

Eduarda Ramos disse...

nuuus.
gostei

Bárbara Lino ♥ disse...

Porque deixar para depois pode [quase sempre] significar nunca realizar!

Unknown disse...

te amo cat =D vc ,sem dúvida, me inspira a viver!!!!!

Unknown disse...

ela foi feliz, é ainda.